ALDO MAES DOS ANJOS
“A ideia da revista me acompanha
desde a infância”
O desenhista Aldo –
nascido Aldo Maes dos Anjos em Curitiba, Paraná, em 10 de novembro de 1974, é
um dos nomes mais conhecidos das histórias em quadrinhos de Santa Catarina.
Desde a publicação do primeiro número da revista “Cartum”, seus personagens
encantam leitores e trazem para dentro de suas páginas humor, informação e a
própria história de Brusque e região. O artista que despertou para as histórias
em quadrinhos aos 3 anos de idade, mora em Brusque, é casado com Vanessa Hames
dos Anjos, e tem dois filhos: Alice Hames dos Anjos e Igor Hames dos Anjos.
Há
na tua família outros artistas do traço?
Tem com certeza ótimos
desenhistas, inclusive um grande arquiteto, irmão do meu pai. Mas outro
cartunista, eu não tenho notícia.
Quando
começou teu interesse pelos quadrinhos e o que te levou a acreditar que esta
poderia vir a se tornar a tua profissão?
Começou a partir dos 3
anos de idade, com a minha mãe lendo quadrinhos para mim diariamente, me proporcionando
uma alfabetização precoce. Durante a infância, minha coleção de quadrinhos era
imensa e, já aos 7 anos eu produzia minhas próprias revistas, com 30 páginas em
média, personagens próprios e roteiros originais. Os desenhos eram toscos como
os de qualquer criança nessa idade, mas foram se aprimorando com a frequência
da prática. Eu sempre tive a certeza que um dia iria lançar uma revista autoral
de quadrinhos.
Teus
quadrinhos têm personagens próprios e bem definidos. De onde vem a inspiração
para criá-los?
As características
pessoais de cada um deles são uma caricatura dos estereótipos humanos que
convivem entre nós e são facilmente identificáveis: o Dagoberto é o dependente
de internet, Bráulio é o pessimista, Gertrudes é a obcecada por limpeza, Jaime
é um cara muito esquecido, Pafúncio é um típico malandro sem muita vontade de
trabalhar...
Quando
um personagem é criado por ti, ele tem um perfil biográfico definido, a exemplo
do que fazem os autores de textos para teatro, roteiros para cinema e TV e
romances, ou este perfil vai sendo moldado de acordo com a tua produção para
tal personagem?
Alguns já nascem
"predestinados", como o Esponja, que veio para assumir o papel do
alcoólatra que vive pagando micos, ou o Bagatela que é a imagem do muquirana
extremamente zeloso com as suas economias. Outros, nascem neutros e acabam se
familiarizando com determinadas situações, como a Marinalva, que virou a
fofoqueira ou o Alfredo que se tornou o fanático por futebol, devido a
situações contidas nas histórias.
O objetivo de cada um destes personagens,
com suas atitudes devidamente ridicularizadas e expostas de maneira infame, é
fazer com que o leitor passe a refletir se ele mesmo não comete os mesmos erros
e, quem sabe até, se corrigir, para não se tornar um Pafúncio, um Esponja ou
outro destes anti-heróis.
A
ideia de produzir a revista "Cartum" surgiu quando?
A ideia da revista me acompanha desde
a infância. O lançamento estava engavetado desde os anos 1990, mas eu ainda não
considerava que os desenhos estivessem bons o suficiente e ficava sempre
protelando o lançamento para o ano seguinte.
Como
foi produzir seu primeiro número? Quem te ajudou na formatação ou foi tudo
criação própria?
A primeira edição da
revista “Cartum” começou a ser produzida imediatamente após a grande notícia de
que a minha esposa estava grávida do meu filho Igor, no ano 2000: coloquei no
papel vários roteiros originais que estavam encalhados das tentativas
anteriores de montar uma revista. Por questões de ordem financeira, resolvi
assumir três empregos simultâneos: durante o dia eu instalava alarmes
residenciais, à noite trabalhava de garçom e nos finais de semana fazia as
histórias em quadrinhos para as quatro primeiras edições, que eram trimestrais.
Como
foi a reação dos primeiros patrocinadores que receberam tua visita em busca de
apoio para publicar a revista "Cartum"?
Eu sabia que não seria
nada fácil, pois eu era desconhecido e sou um péssimo vendedor, envergonhado e
nada convincente. A reação natural do patrocinador é recusar a princípio, e
aguardar para ver se a ideia vai mesmo pra frente. Alguns só foram me receber
depois de cinco anos tentando agendar uma visita, outros nem me receberam
ainda. Mas, para minha surpresa, dentro dos 15 dias que peguei de férias na
empresa na qual trabalhava, consegui realizar a venda de 47 espaços
publicitários necessários para a realização do intento. A maioria de
anunciantes era de empresas que eu vinha tendo contatos profissionais desde
1996, nos meus três empregos anteriores, e até antes disso, que já me conheciam
e confiavam em mim.
Tua
família também contribui com a criação dos teus personagens e situações que
eles vivem?
Com certeza, todos são
uma grande fonte de inspiração. Minha esposa participa da revista diariamente,
envolvida, com contatos telefônicos, agendamentos, entregas de revistas e
correrias em geral. Meu filho Igor está atualmente envolvido com a coloração e
diagramação da revista.
A
produção de uma revista ou de uma série de revistas em quadrinhos demanda mão
de obra especializada. Com quem pudesses ou ainda podes contar, neste processo
de criação?
A criação dos quadrinhos é toda feita por mim
mesmo, exceto as Piadas Clássicas e algumas tiras que são releituras de piadas
populares. Quem me auxilia são os historiadores Marlus Niebuhr e Carlos Eduardo
Michel, com pesquisas que são utilizadas nas páginas da revista Brusque Ontem. Com certeza recorro
também aos valiosos livros do Saulo Adami.
Além
da revista "Cartum" convencional, foram produzidas várias outras
publicações. Quais?
“Cartilha Cartum”: foram
produzidas mais de 40 edições diferentes, com tiragem média de 3500 exemplares,
cada uma abordando algum tema técnico: saúde, trânsito, meio ambiente... Simplificado
em linguagem popular, facilitando ao público leigo a assimilação dessas
informações! A primeira cartilha foi feita em parceria com o CEAB, explicando
as leis do "Estatuto da Cidade". Atualmente está sendo desenvolvida
uma cartilha em parceria com o Observatório Social de Brusque, com o tema
"Educação Fiscal", explicando sobre os impostos, como e para que são
recolhidos, com o objetivo de que esta e as próximas gerações tenham noções de
como são aplicados os tributos que ela paga.
“Brusque Ontem”, com
tiragem média de 4.700 exemplares, distribuídos para estudantes do ensino
fundamental e parceiros da revista “Cartum”. Junto com a “Revista do
Sesquicentenário” e as duas revistas “Gaspar Ontem”, totalizam 20 edições
lançadas falando sobre a história local, permitindo que as gerações atuais e
futuras possam conhecer e assim respeitar o passado local. Já foram abordados
mais de 200 episódios sobre a história de Brusque e 20 sobre a história de
Gaspar.
“Revista
Leitor Vip”: exclusiva para os assinantes da “Cartum”, possui uma tiragem média
de 250 exemplares e é entregue junto com a revista “Cartum” daquele mês, como
uma leitura adicional e exclusiva para os assinantes. Já está na 34ª edição.
“Revista Vamos Brincar”:
com atividades lúdicas e didáticas para a faixa etária de 3 a 6 anos. Está na
sua primeira edição.
Também foram lançadas outras edições especiais, catálogos (sobre gastronomia e automóveis) publicados entre 2003 e 2009, cadernos de ofertas publicados entre 2004 e 2006, teve 10 edições da revista Quadrinhos de Brusque (divulgando o comércio local para os clientes do vestuário atacadista) entre 2006 e 2010, além de outros títulos.
O
que esta produção representa para o artista Aldo?
Os números são
expressivos e para mim representam uma gratidão eterna a todos que aceitaram
realizar parcerias com este trabalho sério e honesto ao longo dos últimos 15
anos, deixando clara a sua aprovação do que estava/está sendo feito e possibilitando
a sua própria existência.
Fizeste
algumas incursões pela história de Brusque e região através dos quadrinhos.
Como foi esta experiência? Há outros projetos sendo preparados nesta linha?
Para mim é um grande
prazer conciliar nas minhas publicações a diversão, o riso e a alegria das
piadinhas – puras e com boas intenções, sem deixarem de ser interessantes – com
a transmissão de novos conhecimentos aos leitores, neste caso, os principais
tópicos da história municipal, além de micro biografias dos cidadãos mais
célebres, para que todos que acompanham a revista possam conhecer quem foram e
que importância tiveram todos estes nomes que se encontram nas placas das ruas
e das praças. Havendo interesse dos patrocinadores, estou sempre preparado para
dar continuidade a este fantástico projeto didático.
Há
escritor que escreve todos os dias, há pintor que pinta todos os dias... Mas, e
o Aldo, também produz todos os dias? Como é a tua rotina, se é que existe uma
na tua vida de autor / criador / editor, quando o assunto é produção de
quadrinhos?
Não pode passar nem um
dia em branco: todos os dias tem que escrever um pouquinho, desenhar um
pouquinho e fazer um pouco de contatos comerciais, não necessariamente nessa
ordem, concentrando-se em algum deles de acordo com a demanda do momento. É
como se essas três atividades fossem bolas, e eu um malabarista de circo.
O
que tens a dizer a um(a) artista principiante na tua área de atuação que esteja
lendo esta entrevista? Valem os esforços? Vale o sonho?
Não sou nenhum exemplo de
sucesso, pois ainda estou longe de obter a minha tão sonhada
"independência financeira", devido a minha maneira de trabalhar, com
ética e honestidade. Mas, ano após ano, vou me virando e seguindo em frente.
Porque a verdade é que não tem como fugir: quando se gosta realmente de uma
atividade a gente acaba insistindo naquilo. E para quem quer seguir carreira
artística, a minha sugestão é que se envolva profundamente e o quanto antes com
tal atividade, fazendo cursos, lendo a respeito e, principalmente, praticando
muito. Nenhuma medalha olímpica é obtida sem que se derrame alguns litros de
suor antes. Mas, que nunca deixe os estudos, que são a principal ferramenta da
qual dispomos para viabilizar a nossa arte profissionalmente.
Do
universo das histórias em quadrinhos, quais os artistas que mais te agradam ou
que eventualmente tenham te inspirado nas tuas produções?
Na infância, eu tive uma
numerosa coleção, contendo principalmente “Turma da Mônica” e Disney, entre
outros. Na adolescência, acompanhava os lançamentos da tríade
Angeli/Laerte/Glauco e apreciava os autores franceses Janu e Frank Margerin, os
quais acredito que tenham exercido a maior influência no meu estilo. Mas não
sou adepto de heróis, nem de quadrinhos violentos ou pervertidos. Sou contra o
uso de palavrões, pois acredito que cada pequeno ato da nossa parte, mesmo que
involuntário, gera um reflexo em todo o ambiente e nas pessoas que estão ao
nosso redor. Então, que esse reflexo seja o mais positivo, útil e agradável
possível. Não custa tentar!